– PEDRO LUSO DE CARVALHO
Leonardo
Sciascia nasceu em Racalmuto, na Sicília, a 8 de janeiro de 1921 e faleceu em Palermo,
a 20 de novembro de 1989. Professor estudioso da escola elementar, desde 1949,
em 1952, lançou o livro de contos Favole
della dittadura; nesse mesmo ano, publicou o livro de poesia La Sicília il suo cuore. Em 1956 lança
seu primeiro romance, Le parochie di
Regalpetra, quando contava com 34 anos de idade. Essa obra foi recebida com
entusiasmo pela crítica, que não tardaria a consagrar o conjunto de sua obra,
com mais de 30 livros – romance, poesia, teatro e ensaio. Leonardo Sciascia foi
um intérprete sério da realidade italiana.
O grande
sucesso de público de Leonardo Sciascia foi O
dia da coruja, que veio juntar-se aos seus outros romances, dentre os quais
me limito a mencionar: O dia da coruja,
já referido, Marjorama desapareceu, 1912
+ 1, A trama, Portas abertas, A bruxa e o capitão e A
denúncia, todos publicados no Brasil pela editora Rocco. Em todos esses
romances, Sciascia narra histórias distintas, em épocas também distintas, mas
que, juntas, parecem constituir-se em um única história, na qual se faz sempre
presente a recorrente derrota da razão e da dignidade humana, contrapondo-se ao
triunfo da injustiça e do embuste. Daí, por certo, o motivo que o levou a
renunciar o cargo no Parlamento Europeu, para o qual foi eleito pelo Partido
Radical, em 1979.
Em O dia da coruja, Sciascia conta, numa
narração enxuta e direta, a história, em dois planos, que se passa numa pequena
aldeia da Sicília, de um oficial dos “carabiniere” nascido no norte da Itália e
vivendo na Sicília: o inquérito conduzido pelo oficial sobre uma série de
crimes da Máfia (primeiro plano), e os fatos relacionados sobre as
cumplicidades poderosas e ocultas (em segundo plano), visando desacreditar os resultados
da investigação, mostrando a inoperância da justiça diante dos acordos e da
violência, que substituíam a lei. Nesse romance, vê-se o mesmo Sciascia das
outras obras, inconformado com a condenação de alguém a uma morte arbitrária.
Para que se possa aquilatar o talento de Leonardo Sciascia, segue um trecho de O dia da coruja (in SCIASCIA, Leonardo. O dia
da coruja. Tradução de Mario Fondelli. Rio de Janeiro: Rocco, 1995, p. 85):
Na
Sicília, pensava o capitão Bellodi, o crime passional não nasce da verdadeira
paixão, da paixão do coração; mas sim de uma espécie de paixão intelectual, de
uma paixão ou preocupação pelo formalismo, como dizer?, jurídico: no sentido
daquela abstração em que as leis vão se tornando cada vez mais impalpáveis
através dos vários degraus de julgamento de nosso arranjo, até chegarem aquela
transparência formal na qual o mérito, isto é, o humano peso dos fatos, já não
vale mais; e, eliminada a imagem do homem, a lei espelha-se na própria lei.
Aquele personagem chamado Ciampa, no Berretto a sonagli de Pirandello: falava
como se na boca dele estivesse o Supremo Tribunal de Justiça reunido em sessão,
tamanho era o cuidado com que anatomizava e reconstituía a forma sem nem tocar
no mérito. E Bellodi tinha dado num Ciampa logo nos primeiro dias de sua chegada
em C: era o próprio personagem de Pirandello, surgido em seu escritório não em
busca de autor, que já tinha tido sumo, mas sim, desta vez, de uma indagação
sutil; e por isso quisera falar com um oficial, pois o segundo-sargento
parecera-lhe incapaz de apreciar a sua elaborada construção lógica.
Dentre
os romances aqui mencionados, de Leonardo Sciascia, farei referência apenas a A trama ("Il contesto"), para
dizer que a obra tem como eixo central o romance policial, técnica que Sciascia
chama de “centrifugação da realidade”. Na narrativa direta, linear, Sciascia
ataca a deformação da política e das alianças oportunistas, em compromissos que
estão sempre se repetindo. Não foi sem razão que o romance A trama foi levado para o cinema, por Francesco Rosi, tendo sido
adaptado por Damiano Damiani, com o título de Cadáveres ilustres. Sobre esse filme e sobre a correspondência de
Sciascia com Italo Calvino, outro importante escritor italiano, e outras obras
do escritor, falarei em outra oportunidade.
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