1 de mai. de 2010

CARTAS: José Verissímo a Machado de Assis





por Pedro Luso de Carvalho



José Veríssimo, como se tornou conhecido no âmbito da literatura, foi registrado com o nome de José Veríssimo Dias de Matos. Nasceu em 8 de abril de 1857, na Colônia Militar, perto de Óbidos, na província do Pará, onde seu pai era médico; morreu no Rio de Janeiro, em 2 de fevereiro de 1916.


Aos doze anos, Veríssimo ingressa no Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, onde inicia seus estudos preparatórios; em 1871 estuda na Escola Central, depois na Politécnica, no curso de engenharia, até 1876, quando abandona os estudos por encontrar-se doente; então volta a ao Pará, e passsa a residir em Belém, sua capital. Passa a escrever no jornal O liberal, e ingressa, como funcionário público, na Companhia de Navegação do Amazonas.


A sua primeira publicação foi Primeiras páginas, em 1878, com os seus escritos jornalísticos reunidos, com temas históricos e críticos, na sua maioria sobre a região do amazônica. Em 1879, funda jornal Gazeta do norte; no ano seguinte vai à Lisboa para participar do congresso internacional, onde apresenta um trabalho sobre o movimento intelectual do Brasil.


Em 1891, Veríssimo muda-se para o Rio de Janeiro, onde passa a lecionar e a exercer o cargo de direitor da Escola Normal, que mais tarde teria o seu nome mudado para Colégio Pedro II. Passa a escrever no Jornal do Brasil recém criado, onde alguns de seu artigos são reunidos em Estudos brasileiros, segunda série. Funda e dirige a Revista Brasileira, em cujo local reuniam-se importantes intelectuais, e onde discutiam a formação da Academia Brasileira de Letras, à qual pertenceu.


José Veríssimo escreveu contos regionalistas e foi um dos mais importantes críticos da literatura do final do século 19 e início do 20; intelectual dotado de autoridade moral, equilibrado e justo quando era levado a apreciar as obras dos escritores contemporâneos seus. Amigo de Machado de assis, com ela matém correspondência – segue uma das cartas que escreveu ao autor de Dom Casmurro – mais adiante, a resposta de Machado a Veríssimo; em ambas as cartas os Veríssimo e Machado fazem menção ao romance Canaã, escrito por Graça Aranha ( S.Luis, MA, 1868 - Rio de Janeiro, 1931), escritor e diplomata; espírito de vanguarda, associou-se à Semana da Arte Moderna e rompeu ruidosamento com a Academia Brasileira de Letras, em sessão memorável, em 1924, da qual sai carregado aos ombros pelos jovens:


Meu caro Machado, - Estive meio zangado com você; fiz ontem anos, os ominosos 45 anos, e v. não me felicitou. Escrevi-lhe um dias destes pedindo-lhe uns números do Temps que me faltaram. Não me são mais preciosos, pois os recebi depois - você deve ter recebido hoje o Canaã, em edição especial, do nosso querido Aranha. Ele mo anunciou em carta na qual me diz que dessa edição só mandou para cá 2 exemplares. Pede-me também que não divulguemos o livro antes dele ser aqui posto à venda, segundo pediu-lhe o editor. Diz-me que só comunique as minhas impressões a v. - o que eu aliás já tinha feito. - Você verá que o livro é soberbo, e vingativo dos que, como nós, não podíamos aturar os “novos”, não por serem “novos”, mas por não terem talento. Estou certo que a sua glória assentada sorrirá benévolo a este sucessor que lhe chega – o único digno do glorioso avô das nossas letras contemporâneas. Espero que não lhe faltará a sua bênção alentadora, inestimável prêmio deste primeiro e já vitorioso feito do nosso cavaleiro. Quem o armaria com mais competência? - Seu de todo o coração – J. Veríssimo.


Rio, 21 de abril 1902. (Machado responde a Veríssimo.)
Meu caro J. Verríssimo, - Recebi sábado o seu recado, e respondo que sim que estou zangado com você, como você esteve comigo. A sua zanga veio de o não haver felicitado pelos 45 anos, a minha vem de os ter feito sem me propor antes uma troca. E a aceitaria de muito boa vontade. - Já recebi e já li Canaã; é realmente um livro soberbo e uma estréia de mestre. Tem idéias, verdade e poesia; paira alto. Os caracteres são originais e firmes, as descrições admiráveis. Em particular, - de viva voz, quero dizer, - falaremos longamente. Vou escrever ao nosso querido Aranha. Na carta em que ele me anunciou o livro, lembra-me aquela “nossa trindade indissolúvel...”. O vento dispersou-nos. - Esta semana, no primeiro dia de despacho, sairei mais cedo e irei buscá-lo ao Garnier. Espero ler a sua análise de Canaã. A propósito, quem será o autor do artigo que saiu hoje no Jornal do comércio? - Adeus, até amanhã ou depois. Já nos vemos poucas vezes. Adeus daquele que já fez 45 anos (bela idade!). - M. de Assis.
P.S. - Abro a carta, hoje 22, para lhe apertar a mão pelo artigo – apoteose de Victor Hugo. - M. de A.



REFERÊNCIAS:
LINS, Álvaro e Aurélio Buarque de Hollanda. Roteiro Literário de Portugal e do Brasil. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1966, vol 2, págs. 150-151, 237-238.
HOUAISS, Antônio. Koogan Larousse. Pequeno Dicionário Enciclopédico. Rio de janeiro: Editora Koogan Larousse do Brasil, 1979, p. 951.

11 comentários:

  1. Absolutamente delicioso, Pedro! Obrigado por esta postagem!

    Peço-lhe uma luz, em meu nome e em nome dos menos letrados como eu: José Veríssimo é o Érico? Talvez o pai dele? Acho que não... É quase contemporâneo... Primo, então?

    O que sei é que o Érico é o pai do nosso Luis Fernando, o sensacional cronista, mas... e esse José? Perdoe-me a ignorância.

    Forte abraço,
    Cesar

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  2. Pedro Luso, muito obrigado pela contribuição. Gostei de conhecer as cartas de Veríssimo e Machado. Graça Aranha é meio empolado, mas se redimiu defendendo a liberdade da criação artística do modernistas.
    Um grande abraço.

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  3. Obrigada mais uma vez por nos presentear com um post tão significativo.
    Meus "botões", com quem sempre converso, estão emocionados. Ao ler esta troca de cartas me senti mais próxima de tais autores. Sempre paira em nós a ideia de que os escritores, especialmente, os que não estão entre nós, que carregavam certa sacralidade. mas aqui, nestas cartas os vi tão humanos, tão igual a mim(não em genialidade, é claro), a nós. Estou meditando um pouco sobre a amizade, este sentimento que perpassa a vida de todos.

    Abraços

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  4. Hoje passo para fazer-te convite.
    Um novo espaço está se formando e gostaria que conhecesse.

    http://in-percepcoes.blogspot.com

    Um abraço, amigo

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  5. adorei o brilhante post.
    decilia de leitura.
    bjos doces.

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  6. Pedro,

    Que bom ficar conhecendo sempre mais sobre nossos valorosos homens de letras que nos deixaram um precisoso legado tanto na vida como na escrita.
    Bjs

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  7. Pedrão

    Reincido no que tenho escrito: és sensacional! Conheço os dois - como autores, naturalmente, sou velhote, mas não tanto...

    Gosto mais do Machado de Assis, mas isso é outra conversa, são outros quinhentos mil réis, como dizia o Victor da Cunha Rêgo, que esteve no Estadão, enquanto homiziado, e que me levou para o DN, quando entrou para Director.

    Mas, sobretudo, gosto do que escreves, dos temas que abordas, da tua Cultura e dos teus muitos saberes. Obrigado.

    Abs
    ...e qjs à tais

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  8. Gosto de ler estas cartas antigas entre amigos ou apenas conhecidos mas que sabem escrever... Há uma doce ironia, delicadeza, troca de ideias...sem contudo esquecer o elemento amizade...
    Perdeu-se o gosto pela escrita, pela escolha do papel e até da tinta utilizada...Tudo fazia parte de um ritual...
    Hoje

    manda-se emails ou sms e com um português em código desconhecendo qualquer dia, como se escrevem as palavras...
    Obrigada Pedro por me trazeres posts destes que a mim, me deliciam.
    Beijo
    Graça

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  9. desejo um
    domingo muito feliz, com amor e paz no coração
    Bjo carinhoso.

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  10. Gosto muito dos artigos de ótima qualidade do seu Blog. Quando for possível dá uma passadinha para ver nosso Curso de Ingles. Daienne

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  11. Achei a idéia de publicar as cartas de uma lucidez engrandecedora. Sempre que as encontro em algum lugar não perco esta oportunidade saboreá-las, principalmente quando se trata de feras. Este humor, a síntese do momento numa elaboração ímpar. Um abraço

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Obrigado a todos os amigos leitores.
Pedro