20 de jul. de 2012

ANTON TCHEKHOV – Enfermaria nº 6


         
                      por  Pedro Luso de Carvalho
      
         
        Em 1979 a editora Editor:Victor Civita publicou As três irmãs e Outros contos, com a tradução de Maria Jacinta e de Boris Schnaiderman, este, sem dúvida, o melhor tradutor do contista russo. Dentre os contos que foram escolhidos para esse livro encontramos um dos contos mais famosos de Anton Tcheckhov, qual seja, A Enfermaria nº 6.

         A história contada por Tchekhov tem como personagem central o médico-chefe de um hospital que acabou sendo internado na Enfermaria nº 6, onde passaria a conviver com doentes mentais. Nessa enfermaria, que ficava anexa ao hospital, cinco pacientes eram supervisionados por Nikita, que os observa com todo o rigor e crueldade.

        Um desses pacientes ocupava importante posição social, outro, um judeu chamado Moseika ficou demente aos vinte anos, quando sua oficina foi completamente destruída por um incêndio. Moseika é o único interno que tem permissão de sair do pavilhão e mesmo do hospital. Sai pelas ruas para mendigar, e quando retorna Nikita toma-lhe o dinheiro que recebia como esmola.

         Ivan Dmitri Gromov, demente, chega a ser posto a ferros, como ocorria com os degredados. Sofria de mania de perseguição. Examinado pelo Dr. Ranguin, este o encaminha para a
Enfermaria nº 6. O quinto paciente a ser internado foi ex-funcionário dos correios, que costumava a falar com Gromov das condecorações que dizia ter recebido.

         O hospital era dirigido pelo Dr. Ranguin, que aspirava seguir a carreira teológica, mas foi impedido pelo seu pai, também médico, que insistiu para que o filho seguisse a sua profissão, intento que teve êxito. O Dr. Ranguin homem corpulento, com tom de voz baixo, movimentava-se com certa lentidão, e era, em muitos aspectos, uma pessoa contraditória. Não se vestia como médico, e demonstrava indiferença no que dizia respeito à sua aparência. Também achava que o hospital era uma instituição imoral, que em nada contribuía para a saúde dos pacientes.

        O trabalho do Dr. Ranguin era extenuante. Sentia-se cansado pelo trabalho e pela monotonia do hospital, que a cada dia era mais monótono. Achava que o seu trabalho como médico era inútil. Num dia atendia 30 pacientes, no outro 35, depois 40, num ramerrão terrível que abrangia meses e anos. Chegou a atender 12 mil pessoas num só ano. O Dr. Ranguin sentia que o seu trabalho era uma fraude.

         A vida do Dr. Ranguin, já tomada pelo desânimo, sofre uma mudança expressiva: deixa de comparecer ao trabalho todos os dias, e quando vai hospital defronta-se com os mesmos aborrecimentos que o afligiam ao longo dos anos. Quando volta para casa dedica-se à leitura de obras de filosofia, biologia e história. Em determinado dia, faz uma visita à
Enfermaria nº 6, para conversar com o interno Gromov, o que viria a repetir-se por vários dias.

        O Dr. Ranguin percebe que o doente mental, Gromov, é pessoa muito inteligente, e logo sente ser ele um bom parceiro para conversar. Essas repetidas visitas e as longas conversas como o interno Gromov começa a causar estranheza em todos os funcionários do hospital, até que o Dr. Khobotov percebeu que seu colega não estava bem de suas faculdades mentais. Depois dessa conversa, o Dr. Ranguin começa a notar que o tratam com estranheza.

         Uma carta foi entregue ao Dr. Ranguin, que tinha como remetente o prefeito, que o convidava para uma reunião, e que parecia ser importante. Lá chegando, encontrou, além do prefeito, o chefe da guarnição, superintendente do distrito escolar, um membro do conselho, o Dr. Khobotov e um outro médico. O Dr. Ranguin sentiu-se desconfortável ante essa recepção.

        O Dr. Khobotov pergunta-lhe qual a data do dia da semana, quantos dias tem o ano; pergunta-lhe, ainda, se é verdade que o interno Gromov é um notável profeta. O Dr. Ranguin responde-lhe que se trata de um rapaz muito inteligente. Nessa altura dos acontecimentos o Dr. Ranguin já tinha percebido que o seu estado mental estava sendo submetido à prova.

         Nesse mesmo dia, à noite, o chefe dos correios vai até a casa do seu amigo, o Dr. Ranguin, para dar-lhe o conselho de que deveria sair de férias, que, segundo o Dr. Khobotov, a viagem seria benéfica para sua saúde. Seu amigo não poupou esforços para convencê-lo a acompanhá-lo a Moscou, São Petersburgo e Varsóvia. Na sua volta encontra o Dr. Khobotov ocupando o seu lugar, fato que o levou a procurar outro lugar para alojar-se.

        A Enfermaria nº 6, que é um dos contos mais longos de Tchekhov, termina de forma trágica: desempregado, o Dr. Ranguin não tem meios para pagar o aluguel, e seu destino acaba sendo a
Enfermaria nº 6, na qual é internado na condição de doente mental. O Dr. Ranguin passou então a usar o roupão azul dos dementes da Enfermaria nº 6. A sorte, no entanto, não o abandonou: um ataque de apoplexia levou-o à morte, um dia após sua internação no pavilhão dos dementes. 

       
        [Ver Anton Tchekhov / Mestre do Conto.]


                                                               *  *  *

4 comentários:

  1. Ler contos de Tchekhov é sempre pisar nos fios de uma navalha.

    Afirmações sempre muito emblemáticas...

    ResponderExcluir
  2. Pedro, sua cultura impressiona demais. Muito obrigado pelas pérolas de sabedoria em seus textos.
    Gustavo

    ResponderExcluir
  3. Jean11:57

    Quais os outros contos neste volume da abril? Estou interessado.

    ResponderExcluir
  4. Respondo ao Jean, quais os outros contos (além de Enfermaria n° 6), que compõem o livro publicado pela Abril - Victor Civita -, como pergunta nesta postagem; são eles:
    As três irmãs, O beijo, Kaschtanka, Viétotchka, Uma crise e Uma história enfadonha.

    Agradeço a sua participação Jean.

    Um abraço,
    Pedro.

    ResponderExcluir


Obrigado a todos os amigos leitores.
Pedro