–
PEDRO LUSO DE CARVALHO
No que se refere a morte do grande poeta
espanhol Federico Garcia Lorca, transcrevemos o que o jornal El Liberal, de
Madri, publicou no dia 2 de novembro de 1936 (in Ian Gibson, O assassinato de
Garcia Lorca, Trad. de Ernani Ssó, Porto Alegre, L&PM Editores, 1988, p.
271):
Mas será possível?
Federico Garcia Lorca, o imenso poeta, assassinado pelos facciosos?
Uma última esperança de
que tamanho crime não tenha se realizado leva-nos a perguntar: mas será
possível a monstruosa aberração que supõe o assassinato do mais alto poeta
espanhol dos nossos dias?
Todos os jornais
publicaram a notícia que, segundo um jornal de Albacete, procedia de Guadix.
Conhecemos bem a louca e
fria perversão dos traidores. Mas um nobilíssimo impulso da nossa alma nos leva
a duvidar da veracidade da horrível informação.
Federico Garcia Lorca
fuzilado pelos degenerados facciosos! Será possível tanta maldade? E embora
temamos que sim, que essa gente é capaz de tudo, queremos acolher uma última
esperança, repetimos, queremos acreditar que tudo, até a escala da maldade dos
fascistas, tem um limite.
A Espanha inteira, toda
a Espanha democrática e republicana, vive momentos de angústia e os viverá
enquanto não seja retificada ou ratificada a inimaginável maldade dos verdugos.
Federico Garcia Lorca foi fuzilado em
agosto de 1936, em Granada, no início da Guerra Civil Espanhola, e seu corpo
nunca foi encontrado. Estava com 38 anos de idade, quando foi assassinado, e já
era considerado um dos maiores poetas e teatrólogos da Espanha.
Os poemas que aqui serão transcritos, o
primeiro, com tradução, A Lua e a Morte, e, o segundo, Gacela
del amor desesperado, no idioma do poeta, integram a Antologia
Poética de Federico Garcia Lorca, obra bilíngue, com tradução de
William Agel de Mello, São Paulo, Martins Fontes, 2001, p.39-41; 218, 220:
A LUA E A MORTE
– FEDERICO GARCIA LORCA
A lua
tem dentes de marfim,
Quão
velha e triste assoma!
Estão
os álveos secos,
os
campos sem verdores
e as
árvores murchadas
sem
ninhos e sem folhas.
Dona
Morte, enrugada,
passeia
pelos salgueirais
com seu
absurdo cortejo
de
ilusões remotas.
Vai
vendendo cores
de cera
e de tormenta
como
uma fada de conto
má e
enredadora.
A lua
comprou
pinturas
da Morte.
Nesta
noite turva
está a
lua louca!
Eu,
enquanto isso, ponho
em
peito sombrio
uma
feira sem músicas
com
tendas de sombra.
-/-/-
GACELA DEL AMOR DESESPERADO
– FEDERICO GARCIA LORCA
La
noche no quiere venir
Para
que tú vengas,
ni yo
pueda ir.
Pero yo
iré,
Aunque
um sol de alcranes me coma la sien.
Pero tú
vendras
Com la
lengua quemada por la lluvia de sal.
El día
quiere venir
para
que tú no vengas,
ni yo
pueda ir.
Pero yo
iré
entregando
a los sapos mi mordido clavel.
Pero tú
vendras
por las
turbias cloacas de la oscuridad.
Ni la
noche ni el día quierem venir
para
que por ti muera
y tú
mueras por mi.
* * *