– PEDRO LUSO DE CARVALHO
O célebre poeta frances
Charles Baudelaire, escreve, no prefácio para Poemas
e ensaios, de Edgar
Allan Poe, que o escritor norte-americano “se apresenta sob três
aspectos: crítico, poeta e romancista; e mais – diz Baudelaire -,
no romancista há um filósofo. Referindo-se ao trabalho que Poe
desempenhava no jornal Mensageiro
Literário do Sul,
diz Baudelaire, referindo-se às críticas que escrevia: “Todas são
feitas com o maior cuidado, e denotam no autor um conhecimento das
diversas literaturas e uma aptidão científica que recordam os
escritores franceses do século XVIII”.
Sobre o Poe ficcionista,
escreve Baudelaire: “Como novelista e romancista, Edgar Poe é
único no seu genero, como Maturim, Balzac, Hoffmann. . Os variados
trabalhos que espalhou em revistas foram reunidos em dois grupos:
Contos grotescos
e do arabesco,
o outro Contos de
Edgar A. Poe, edição Wilwy e Putnam. Forma tudo um total de setenta
e dois trabalhos mais ou menos. Há ali bufonadas violentas, puro
grotesco, aspirações desenfreadas para o infinito e uma grande
preocupação pelo magnetismo”.
No que respeita à poesia de
Poe, escreve Baudelaire: “Como poeta, Edgar Poe é um homem à
parte. Representa quase sozinho o movimento romantico do outro lado
do oceano. É o primeiro americano que, propriamente falando, fez do
seu estilo uma ferramenta. Sua poesia, profunda e gemente, é, não
obstante, trabalhada, pura, correta e brilhante, como uma jóia de
cristal. Edgar Poe amava os rítmos complicados e, por mais
complicados que fossem, neles encerrava uma harmonia profunda”.
A prova, do que diz Charles
Baudelaire sobre a excelencia da poesia de Edgar Allan Poe,
encontra-se no seu poema:
A CIDADE NO MAR
– EDGAR ALLA POE
Olhai! A Morte edificou o seu
trono
numa estranha cidade solitária
por entre as sombras do
longínquo oeste.
Lá, os bons, os maus, os
piores e os melhores,
foram todos buscar repouso
eterno.
Seus monumentos, catedrais e
torres
(torres que o tempo rói e não
vacilam!)
em nada se parecem com os
humanos.
E em volta, pelos ventos
olvidadas,
olhando o firmamento,
silenciosas
e calmas, dormem águas
melancólicas.
Ah! luz nenhuma cai do céu
sagrado
sobre a cidade, em sua imensa
noite.
Mas um clarão que vem do
oceano lívido
invade os torreões,
silentemente,
e sobe, iluminando capitéis,
pórticos régios, cúpulas e
cimos,
templos e babilonicas
muralhas;
sobe aos arcos escuros e
esquecidos
onde o granito se fecunda em
flores;
sobe aos templos magníficos,
sem conta,
onde os frios se enroscam e
entretecem
de vinhedos, violetas,
sempre-vivas.
Olhando o firmamento,
silenciosas,
calmas, dormem as águias
melancólicas.
Torreões e sombras tanto se
confundem
que é tudo como solto nos
espaços.
E a Morte, do alto de soberta
torre,
contempla, gigantesta, o
panorama.
Lá, os sepúlcros e os
templos se escancaram
mesmo ao nível das águas
luminosas;
mas não pode a riqueza
portentosa
dos ídolos com olhos de
diamante,
nem das jóias que riem sobre
os mortos,
tirar as vagas do seu leito
imóvel;
pois, ai! Nem leve movimento
ondula
esse imenso deserto
cristalino!
Nem ondas falam de possíveis
ventos
sobre mares distantes, mais
felizes;
ondas não contam que
existiram ventos
em mar de menos espantosa
calma.
Mas, vede! Um fremito percorre
os ares.
Uma onda... Faz-se ali um
movimento!
E dir-se-ia que as torres
vacilaram
e afundaram de leve na água
turva,
abrindo com seus cumes,
debilmente,
um vazio nos céus enevoados.
As ondas tem, agora, luz mais
rubra,
as horas fluem, languidas e
fracas.
E quando, entre gemidos
sobre-humanos,
a cidade submersa, for
fixar-se no fundo,
o Inferno, erguido de mil
tronos,
curvar-se-á, reverente.
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REFERENCIA:
POE, Edgar Allan. Poemas e ensaios. Tradução de Oscar Mendes e
Milton Amado, 3ª ed. Revista. São Paulo: Editora Globo, 1999, págs.
11-13, 45-46.)
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