– PEDRO LUSO DE CARVALHO
O primeiro livro de ficção de Susan Sontag, O benfeitor, foi publicado no Brasil em 1963 pela L&PM, com
a tradução de Ana Maria Capovilla. Essa editora já havia publicado seus livros
de ensaio e crítica: Contra a
interpretação, Sob o signo de Saturno
e A doença como metáfora. Sontag
publicou ao todo 15 livros, entre eles os romances
The Benefactor, Death Kit e The Volcano Lover; publicou também uma
coletânea de contos e três coletâneas de ensaios.
Versátil, Sontag escreveu e dirigiu quatro filmes: Duets for Cannibals, Brother
Carl, Promised Land e Unguided Tour (de 1969 a 1983). Também
editou e apresentou textos de Antonin Artaud, Roland Barthes e Danilo Kis. Mais
ainda: escreveu prefácios para os livros de Robert Walser, Marina Tsvetayeva,
Machado de Assis e Juan Rulfo, entre outros, no período de 1982 a 1995.
Susan Sontag foi uma das mais importantes intelectuais dos Estados
Unidos. Nasceu em Nova Iorque, em 1933, e criou-se no Arizona e Carolina do
Sul, tendo-se formado em 1951 na Universidade de Chicago. Recebeu dois títulos
de Mestre na Universidade de Harvard: Inglês, em 1954, e Filosofia, em 1955.
Sua vida acadêmica, como professora de Filosofia e de História da
Religião, foi até o início dos anos 60. Viveu em Paris por um ano, depois
passou a residir em Nova Iorque, com retornos frequentes à Europa. Dentre os
prêmios que ganhou destaque-se: National Book Critics Circle Award, com Photography, em 1977.
Segue trechos da entrevista que Susan Sontag concedeu a Edward Hirsch
para The Paris Review, entrevista
essa que se estendeu por três dias, no seu apartamento em Manhattan, no mês de
julho de 1994 (In Plimpton, George. The Paris Review. Escritoras e a arte da
escrita. Tradução de Maria Ignez Duque Estrada. Rio de Janeiro: Gryphus, 2001):
Hirsch pergunta se ela se incomoda se a chamam de intelectual.
SONTAG: Bom, a gente não gosta de ser chamada de coisa alguma. E essa
palavra tem mais sentido para mim como adjetivo do que como substantivo, embora
eu suponha que se refira sempre a alguém extravagante e sem graça –
especialmente se for mulher. Isso me torna ainda mais engajada em minhas
polêmicas contra os clichês comuns sobre os intelectuais que fala de coração
versus cabeça, sentimento versus intelecto e assim por diante.
Que mulheres foram importantes para a senhora?
SONTAG: Muitas. Sei Shonagon, Jane Austen, George Eliot, Emily
Dickinson, Virginia Woolf, Marina Tsvetayeva, Anna Akhmatova, Elizabeth Bishop,
Elizabeth Hardwick… a lista não acaba. Do ponto de vista cultural as mulheres
são uma minoria, e com minha consciência de pertencer à minoria, eu me regozijo
com as contribuições das mulheres. Com minha consciência de escritora, me
regozijo com quaisquer escritores que admire, sejam mulheres ou homens.
Hirsch diz-lhe que a sua impressão é de que sua ideia madura (Sontag) de
uma vocação é mais europeia do que americana.
SONTAG: Não tenho tanta certeza. Acho que é minha marca particular. Mas
é verdade que, vivendo na segunda metade do século XX, posso satisfazer meus
gostos europeus sem propriamente me expatriar e ainda passar boa parte de minha
vida adulta na Europa. Esse tem sido meu jeito de ser americana. Como Gertrud
Stein observou: ‘Para que servem as raízes se você não pode carregá-las com
você?’ Pode-se dizer que isso é muito judeu, mas é americano também.
Existe alguma coisa que a ajude a começar a escrever?
SONTAG: A leitura – que raramente está relacionada com o que estou
escrevendo, ou desejando escrever. Leio muito sobre história da arte, história
da arquitetura, musicologia, livros acadêmicos sobre vários assuntos. E poesia.
Começar é, em parte, ganhar tempo, ganhar tempo lendo e/ou escutando música, o
que me dá energia e também me angustia. Sinto-me culpada por não estar
escrevendo.
Ficou antiquado pensar-se que o propósito da literatura é de nos educar
sobre a vida?
SONTAG: Bem, de fato ela nos educa sobre a vida. Não seria a pessoa que
sou, não compreenderia o que compreendo se não fossem alguns livros. Estou
pensando na grande questão da literatura russa do século XIX: como se deveria
viver? Um romance que merece ser lido é um aprendizado do coração. Alarga o
sentido das possibilidades humanas, do que é a natureza humana, do que acontece
no mundo. É um criador de vida interior.
A literatura provoca êxtase?
SONTAG: Certamente, mas menos confiável do que o da música e da dança: a
literatura tem mais a ver com a cabeça. Precisamos ser rigorosos com os livros.
Só quero ler o que vou querer reler – essa é a definição de um livro que vale a
pena.
A senhora sempre volta atrás e relê seus trabalhos?
SONTAG: Só para rever traduções. Não, de modo algum. Não sou curiosa.
Não sou apegada à obra que já está pronta. E também porque não quero reconhecer
que tudo é sempre igual. Talvez eu sempre relute em reler qualquer coisa que
tenha escrito há mais de dez anos porque isso destruiria minha ilusão de que
estou sempre começando. É isso que é mais americano em mim: sempre sinto que é
um novo começo.
No final da entrevista da qual foi transcrita apenas parte dela, como
disse acima, Edward Hirsch, da The Paris Review, pergunta à escritora: A
senhora pensa muito no público que vai ler seus livros?
SONTAG: Não ouso. Não quero. Mas, de qualquer modo, não escrevo porque
existe um público, mas escrevo porque existe a literatura.
Susan Sontag foi casada com Philip Rieff (1950), sociólogo e crítico
cultural, e professor das Universidades de Berkeley e Harvard, entre outras, e
ficou conhecido pelos seus estudos sobre Freud e sobre a ética na cultural
ocidental; do casamento, que durou nove anos, nasceu um filho, David Rieff,
jornalista e analista de política internacional. A escritora morreu em Nova
Iorque, em 28 de dezembro de 2004 - 19 dias antes de completar 71 anos.
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Thank you for sharing, very interesting reading.
ResponderExcluirObrigado, Solcarina.
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Abraço.