À ESPERA DE SEU ALGOZ
– PEDRO LUSO DE CARVALHO
É noite chuvosa. No quarto, às escuras, Mariana olha absorta através da
janela. As luzes da rua clareiam parte da cama, em desalinho, e alguns livros
sobre o velho baú. Debruça-se no parapeito da janela. Na calçada, escondido
entre ramos de árvores, o grande relógio, com seus ponteiros duplicados pelos
efeitos das sombras. Mariana assusta-se ao ver que já passam das dez. Ali
permanece por algumas horas. Paralisa-a um pressentimento: Orestes irá cumprir
a ameaça que fez. Logo o medo tira-lhe das pernas a força. Respira com
dificuldade. O coração de Mariana agora bate em descompasso. Está ansiosa para
que tudo termine. Conta minutos e segundos. Na rua, o silêncio somente é
quebrado pelo ruído de algum carro, que passa sobre o asfalto molhado. Mariana
sente-se tonta e cai. No chão, segura os joelhos e os levam próximos ao rosto.
É o refúgio que busca. Depois, ouve seca batida na porta. Novamente o silêncio.
Não demora a ouvir o ranger da porta. Na fechadura, o barulho da chave. A porta
é trancada por dentro. No assoalho, um leve barulho de passos. O ritmo dos passos está mais próximo,
e logo cessa à sua frente. Mariana está
ainda no chão, encolhida sobre assoalho. Está assustada com o silêncio que se
alarga. De repente uma lâmina zune no escuro do quarto, e o silêncio é quebrado
por um grunhido de ave ferida.
* * *