PEDRO
LUSO DE CARVALHO
MARIO
VARGAS LLOSA escreveu o romance Quem
Matou Palomino Molero?
em 1986. Nesse mesmo ano o livro foi publicado no Brasil pela editora
Francisco Alves, com a tradução de Remy Gorga Filho. Bella Jozef
disse sobre essa obra: “O narrador traça o quadro deprimente de
uma realidade com o problema da injustiça e estratificação das
classes sociais que divide e separa também as etnias, alternando a
geografia física e psicológica”.
A
história contada por Vargas Llosa se passa nos anos cinquenta, tendo
por personagens centrais os policiais: Tenente Silva e Lituma. Lituma
encontrou o corpo de Palomino Molero enforcado na velha algarobeira,
com sinais em seu corpo de atos de tortura, como é narrado no início
da obra:
“Antes
e depois de matá-lo haviam cortado seu corpo em tiras com uma
crueldade sem limites: tinha o nariz e a boca cortados, coágulos de
sangue ressequido, equimoses, queimaduras de cigarro, e, como se não
fosse bastante, Lituma compreendeu que também haviam tentado
capá-lo, porque os ovos pendiam até a entreperna. Estava descalço,
despido da cintura para baixo, com uma camiseta em pedaços. Era
jovem, magro, moreninho e ossudo (...). – Quem fez isto –
balbuciou, contendo a náusea”.
O
crime, que foi cometido no pequeno povoado do Peru, Talara, onde se
encontrava instalada a International Petroleum Company, com seus
escritórios e as casas dos gringos, e a Base Aérea de Piura, deixou
o guarda Lituma abatido por pressentir que o assassinato de Palomino
Molero poderia representar uma ameaça para ele, caso algum peixe
grande da Base Aérea estivesse envolvido no crime, como disse a um
interlocutor seu: “- Mas não posso tirar o magrinho da cabeça.
Tenho pesadelos, parece que estão arrancando os meus ovos como
fizeram com ele. Coitadinho: morreu com ele pelos joelhos e achatados
como ovos fritos”.
A
partir daí o Tenente Silva e o seu subordinado Lituma passaram à
fase de investigação da autoria do crime, andando praticamente no
escuro à busca de suspeitos. Aos poucos começaram a aparecer aqui e
ali alguns elementos que resultavam em indícios, até que passaram a
suspeitar do Comandante da Base Aérea, o Coronel Mindreau. Este
recebeu os policiais em seu gabinete, pela segunda vez: “- Em que
posso servi-los? – murmurou com uma urbanidade que sua expressão
glacial contradizia. – Aqui estamos outra vez pelo assassinato de
Palomino Molero – respondeu o Tenente, com todo respeito. – Para
solicitar sua colaboração, meu Coronel”.
A
investigação prosseguia com seus percalços e temores,
principalmente por parte do guarda Lituma. Passaram então a dar
maior atenção ao suspeito principal, o Coronel Mindreau, depois que
receberam uma denúncia anônima, acusando-o da autoria do crime. E,
para surpresa dos policiais, estes descobriram que o bilhete com a
denúncia foi escrito pela própria filha do Coronel, Alícia
Mindreau, namorada de Palomino Molero, com quem fugira para casar-se.
O casamento só não se consumou pela ação do Coronel Mindreau.
A
investigação prosseguia tensa à vista dos riscos para o Tenente
Silva e para o guarda Lituma: o suspeito era pessoa influente e capaz
de atos violentos. O dia-a-dia dos policiais somente era amenizado
com a presença Dona Adriana, casada com o pescador Moisés, homem
bem mais velho que ela. O Tenente Silva não escondia que sentia uma
forte atração física por essa mulher gorda e bem mais velha que
ele. Lituma não compreendia esse sentimento; não entendia por que
ela lhe dava tanto tesão: “- Se continuar olhando assim para Dona
Adriana, seus olhos vão gastar, meu Tenente” – disse-lhe Lituma.
Fora
esses momentos de descontração na pensão de Dona Adriana, o resto
do tempo os dois policiais passavam envolvidos com a investigação.
O Tenente Silva esforçava-se para descobrir o assassino de Palomino
Molero, não que estivesse obcecado para que fosse feita a justiça,
mas sim pela curiosidade que o perseguia; queria saber a todo custo
quem matou Palomino Molero. O guarda Lituma admirava o estilo do
Tenente Silva, que sabia como arrancar os segredos das pessoas.
Quando foi procurado por Alícia Mindreau, numa tarde em que espiava
com um binóculo Dona Adriana banhar-se num lago, essa qualidade foi
posta à prova.
O
tenente Silva nesse dia foi surpreendido pela filha do Coronel
Mindreau quando se deliciava com a nudez de Dona Adriana. Lituma
ouviu o Tenente dizer a Alícia: “- É perigoso surpreender assim
uma autoridade em seu trabalho, senhorita. E se, de ricochete, pega
um tiro? – Em seu trabalho? – desafiou-o ela, com uma gargalhada
sarcástica. – Espiar mulheres que tomam banho é seu trabalho?”.
Nesse
dia, a investigação dos dois policiais chegou ao paroxismo quando
Alícia Mindreau acusou seu pai, o Coronel Mindreau, de ser o
responsável pela morte de Palomino Monlero. No Posto da Guarda
Civil, Alícia contou ao Tenente Silva a conversa que tivera com seu
pai: ele a procurou meio louco de susto e arrependimento: “- Sou um
assassino Alicinha. Torturei e matei o recruta com quem você fugiu”.
A
partir dessa altura da investigação tudo indicava que nada mais
restava para ser esclarecido, o que não significava que haveria
condenação do Coronel Mindreau, depois da conclusão do inquérito
policial, pelo Tenente Silva. Não ficaria a dúvida sobre a autoria
do crime, mas ainda não estavam esclarecidas as circunstâncias de
tal ato, e, tampouco, não se poderia prever o que viria ocorrer com
o assassino de Palomino Molero, O Coronel Mindreau. Alícia teria
falado a verdade sobre as relações sexuais que dizia ser obrigada a
manter com seu pai, o Coronel Mindreau?
Por
outro lado, o Coronel, pai de Alícia, teria falado a verdade quando
negou ter forçado a filha a manter relações sexuais com ele por
muitos anos? As afirmações que fizera eram verdadeiras? O certo é
que, na praia onde se encontravam, o Coronel Mindreau confessou ter
matado Palomino Molero. E que, depois da confissão, pediu que os
policiais o deixassem ali. E que, após terem se afastado, ouviram um
estampido que indicava tratar-se de um tiro.
O
leitor verá que a história de Vargas Llosa não tem como único
clímax a descoberta do assassino de Palomino Molero; o ápice da
narrativa vem depois da confissão do Coronel Mindreau de ser ele o
assassino. Portanto, o desfecho da história não está unicamente na
descoberta da autoria do crime, mas também com o que ocorre com o
assassino de Palomino Molero e com Alícia, filha do Coronel.
Espero
não ter tirado a curiosidade do leitor sobre o desenlace completo
dessa história, por ter revelado o nome do assassino, já que restou
ser contado o que aconteceu com o Coronel e com sua filha Alícia. O
certo, no entanto, é que Quem Matou Palomino Molero? está colocado
entre os melhores romances de Mario Vargas Llosa, que a cada livro
seu vem confirmar ser ele um dos escritores mais importante da
literatura sul-americana.
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Pedro