22 de fev. de 2016

[Conto] ERIC NEPOMUCENO – Às sete em ponto



 – PEDRO LUSO DE CARVALHO

ERIC NEPOMUCENO é um conhecido jornalista, escritor e tradutor. Trabalhou no Jornal da Tarde, de São Paulo, colaborou com diversas publicações da Argentina, México e Venezuela. Entre elas, o jornal La Opinión, de Buenos Aires (1973 a 1975), o jornal Excelsior, do México (1974), o jornal El Nacional, de Caracas (1974 a 1975) e a agência de notícias Latin (1974 a 1975). Foi colaborador permanente da revista Crisis, de Buenos Aires (1973 a 1976).
Nepomuceno traduziu ao português vários autores contemporâneos, gigantes da literatura hispânica, como Gabriel García Márquez, Juan Carlos Onetti, Eduardo Galeano, Juan Rulfo, Julio Cortázar, Jorge Luis Borges e outros. Inclusive, seus três primeiros livros foram publicados em espanhol.
Ganhou duas vezes o prêmio Jabuti pela tradução de autores de língua espanhola, além de vários outros prêmios com seus livros de contos e de não-ficção.
Segue Às sete em ponto, conto de Eric Nepomuceno (in Nepomuceno, Eric. A mulher do professor. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1996, p. 30-32):


      ÀS SETE EM PONTO
           – ERIC NEPOMUCENO

 As mãos espalmadas, os dedos finos, jogaram os cabelos negros e lisos para trás:
– Preciso telefonar para casa, falar com minha mãe.
Foi a primeira coisa que ele disse. Depois, perguntou:
– Como foi o seu dia? Acho que o frio está chegando. Peça um licor e um chá para mim, está bem? E alguma coisa de comer. Estou com fome, não pude almoçar. Preciso telefonar. Você pede para mim?
Eu não gostava daquele café. Gostava da praça, a primeira que conheci na cidade, e que se chamava praça San Juan de la Cruz. Havia dois cafés na praça. Um, ao lado do hotel, onde eu morava; outro, no extremo oposto da praça. Estávamos no café longe do hotel:  mesas de fórmica, cadeiras forradas de plástico vermelho. Estávamos em uma mesa ao ar livre, era um fim de tarde de outubro, fazia frio. Eram sete da noite quando ela chegou. Tínhamos dito: às seis e meia, no café da esquina; ela chegou às sete. Veio bonita. Eu gostava de olhar seu rosto e olhar seu sorriso e olhar suas mãos.
Pensava nisso quando vi que ela  me olhava sorrindo; talvez eu estivesse sorrindo também. Ela perguntou, calma:
– E como foi seu dia?
– Bem, sem nada de novo, nenhuma emoção. Escrevi cartas e cartões-postais de manhã, almocei, fumei um charuto, caminhei de tarde, fui ver um amigo. Nada de emoções.
– E você está bem?
– Claro, por que não? E você?
– Estou ótima. Agora, vou telefonar: está ficando tarde.
Eram sete da noite, ela acabara de chegar e estava bonita. No outro dia, bem cedinho, fui-me embora. Levei um ano para voltar, e ela estava com os cabelos curtos.
Quando voltei era dezembro e dois dias antes tinha nevado na cidade, fazia frio e as ruas estavam sujas.
O café estava fechado. Nos encontramos na rua e ficamos olhando o café, tentamos sorrir e eu perguntei:
– E agora, para onde vamos?
Ela disse que para lugar nenhum. Queria ver se eu continuava vivo, só isso. E já tinha visto.
Fiquei parado, fazia frio e ventava, olhando para ela, que atravessou devagar a rua e entrou em um carrinho pequeno, cor de cinza.



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